sábado, janeiro 23

História dos CRIs

É uma não história com mais de 20 anos.

Os Centros de Responsabilidade, previstos no artigo 9.º do decreto-lei 19/88, constituem um meio previsto pelo legislador para obter “a maior eficiência técnica e social” dos hospitais.
Acreditar que, em ambiente de Função Pública tradicional, seria possível desenvolver os princípios da gestão empresarial foi pura ingenuidade.
A Administração Pública Clássica constitui um sistema burocrático, estando por isso marcada pelas características da burocracia.
A Burocracia Weberiana é um modelo onde, em tese, prevalecem a competência técnica, a promoção meritocrática, a profissionalização da gestão e se procura garantir a previsibilidade de funcionamento.
Na prática o modelo burocrático apresenta disfunções que são conhecidas: internalização das regras e exagero no apego aos regulamentos, excesso de formalização, despersonalização das relações, absoluta conformidade em relação às rotinas, exibição de sinais de autoridade, conflitos com o publico, dificuldade de atendimento dos clientes e, “ last, but not least,” resistência à mudança.
O modelo burocrático promove a estabilidade, que é, obviamente, um valor a ter em conta. Mas quando está em jogo uma mudança profunda, como é a necessária a permitir a descentralização dos poderes de gestão, a burocracia é completamente inadequada.
Por isso não foram criados Centros de Responsabilidade, à excepção do Centro de Responsabilidade de Cirurgia Torácica dos HUC, link que constitui isso mesmo; a excepção que confirma a regra.
Dez anos passados, e mantendo-se o mesmo estatuto hospitalar, o MS tentou, de novo, implantar Centros de Responsabilidade. Uma equipa de projecto criada por Despacho Ministerial elaborou os Princípios e Regras de Funcionamento dos Centros de Responsabilidade Integrados nos Hospitais. Com base nesse estudo, a DGS emitiu um Despacho pedindo aos Hospitais - a todos - o envio do “desenho organizacional em CRI” da instituição, num prazo inferior a 30 dias.
Esse pedido deu origem a vários disparates, o maior dos quais protagonizado pelo CA de um pequeno hospital, com cerca de 100 camas, que terá proposto a criação de mais duma dezenas de CRIs. Não consta que os proponentes tivessem sido demitidos, com justa causa.
Sobre o Documento da equipa de projecto a APAH produziu um parecer onde, se afirmava “ Parece-nos que as preocupações manifestadas e expectativas preconizadas, pressupõem uma alteração prévia do “ambiente” em que se exerce a gestão hospitalar, não se vislumbrando condições objectivas e subjectivas para que, de imediato se implementem, com consistência e profundidade formas intermédias de administração.”
Uma dessas condições tinha a ver, em minha opinião, com o estatuto jurídico dos hospitais. Por isso tive a esperança que a empresarialização hospitalar criasse o ambiente propício à descentralização da gestão através da criação dos CRIs.

Tudo parece ter continuado na mesma e eis-nos de novo, 21 anos depois da consagração em lei dos CRIs a discutir o tema. E, em minha opinião a abordar o assunto, mais uma vez, de forma errada.
A criação de um ou outro CRI, num ou noutro hospital, não tem qualquer sentido. Do que realmente se trata é, como aliás se pedia no Despacho da DGS, de organizar em CRIs todo o hospital. Só que não se pode pretender a utilização deste modelo em todos os hospitais, independentemente da sua dimensão e complexidade, nem, tão pouco, pedir o desenho duma solução no prazo de 30 dias.

A reorganização dum hospital em CRIs deve ser encontrada no âmbito do planeamento estratégico.
Sabemos que a análise estratégica tem por finalidade pôr em relevo as vias mais favoráveis ao desenvolvimento duma organização, num contexto incerto e evolutivo, de modo a optimizar os recursos disponíveis.
Cremadez define bem as características duma boa estratégia. Esta deve ser:
- Aberta, dando prioridade às necessidades específicas do seu envolvimento.
- Objectiva, confrontando os dados concretos com a subjectividade dos “ actores”, de modo a produzir uma reflexão isenta dos elementos de ordem ideológica e corporativa.
- Positiva, identificando os factores chave do sucesso sem os confundir com aquilo que os profissionais sabem ou gostam de fazer.
- Realista, constituindo um quadro de referência através do qual a sucessão aleatória de oportunidades possam ser rapidamente avaliadas.
- Compulsiva, facilitando o exercício das responsabilidades e obrigando os responsáveis sectoriais a conceber planos de acção incorporados numa visão de conjunto.
A estratégia aparece-nos assim como um elemento fundamental da integração.

As principais forças centrífugas num hospital são o corporativismo e a diferenciação.
A primeira dilui-se no âmbito do grupo de trabalho. O sentimento de pertença ao grupo e a necessidade de colaboração geram laços de união no seio dum serviço, mas constituem também factores de diferenciação organizacional.
Para a contrabalançar, sem destruir a coesão dos grupos da base, é necessário situar cada sector no contexto da actividade global da instituição. Ou seja, é necessário fazer participar cada responsável na definição da estratégia institucional.
Não acompanho alguns Colegas do Blog que receiam que a criação dos CRIs possa conduzir à balcanização do Hospital.
A balcanização já existe e é fruto da centralização de poderes e da atomização do Centro Operacional. Na ausência duma estratégia global, elaborada com a participação dos diversos actores, cada Serviço define a sua própria estratégia e desenvolve a sua actividade, sem preocupações de articulação com os outros elementos do sistema, nem com os objectivos estratégicos da instituição.
A constituição de estruturas funcionais, agrupando vários centros de custo com actividades homogéneas ou afins, dotadas da necessária autonomia, usando poderes adequadamente desconcentrados e compartilhando as responsabilidades correspondentes aos poderes exercidos, parece-me, ao contrário, um meio adequado de combater a balcanização.
O termo compulsivo utilizado por Cremadez para caracterizar a estratégia pode chocar espíritos mais sensíveis. Mas não podemos retirá-lo do seu contexto. Quando se fala em desconcentrar poderes nos CRIs não se está a dizer que estes devem dispor de total autonomia.
Na prática, os graus de autonomia constituem um contrato, sendo necessário, em cada caso, precisar os seus limites, em função das condições concretas existentes. O que se trata, no fundo, é de estabelecer contratos de gestão entre o CA e os CRIs.
E os contratos, meus Caros Amigos, os contratos são para cumprir.
Brites

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14 Comments:

Blogger Bicho said...

O meu aplauso para Brites pela forma como expõe o assunto, colocando a tónica na importância do planeamento estratégico na reorganização de um hospital e nas incontornáveis diferenças entre hospitais, que tornam inadequada a aplicação de modelos iguais para realidades diferentes.
E depois... a componente fundamental: - O que se trata, no fundo, é de estabelecer contratos de gestão entre o CA e os CRIs.
E os contratos, meus Caros Amigos, os contratos são para cumprir!...
Eis porque para que alguma coisa mude realmente é necessário ter directores, gestores, que não o sejam, que não o queiram ser, pelo "estatuto" que daí lhes adevém mas sim pelo serviço público, pelos resultados, de que deveriam orgulhar-se poderem demonstrar ser capazes.

12:43 da manhã  
Blogger Hermes said...

Excelente post.

Brilhante, rigoroso e sintético.

Esclarecedor quanto à profundidade de análise e à visão do seu autor, larga e visionária.

10:05 da manhã  
Blogger Hospitaisepe said...

Excelente

«A reorganização dum hospital em CRIs deve ser encontrada no âmbito do planeamento estratégico.»

Não posso estar mais de acordo.
Vamos ver se as administrações dos novos hospitais - EPE, PPP - aproveitam a oportunidade para implementação dos CRIs.

Afigura-se-me, no entanto, que o modelo PPP é demasiado centralizador em função do seu objectivo estrito, prioritário, de controle de custos (ou lá se vão as margens) de forma a não permitir a implementação de CRIs.

10:14 da manhã  
Blogger Antunes said...

Perguntem ao José Manuel Boquinhas , ao Hugo Meireles e ao Artur Vaz o que é que eles acham dos CRIs.

Aposto que responderão algo parecido com isto: " Estamos a estudar a hipotese de implementação dessa forma de organização".
O que traduzido em linguagem corrente quererá dizer: Bem, isso dos CRIs é muito bom e bonito, mas nós temos outras coisas muito mais importantes com que nos incomodar.

10:26 da manhã  
Blogger aidenós said...

Que o Post do Brites é excelente pelo rigor e serenidade da análise, sem atacar ninguém, não vale a pena dizê-lo porque salta aos olhos de todos e para todos é um modelo de abordagem. Assim fôssemos capazes de o acompanhar.
Também é evidente a sua oportunidade, quando AJ elege como prioridade a reforma dos hospitais pela criação deste modelo de gestão interna (organização em CRIs ou outros que confiram maior responsabilidade e autonomia.
Afirmando como imprescindível a definição da estratégia e sustentando que só desta pode derivar a criação bem sucedida dos CRIs, o Brites não só envia um importante recado como também, se for ouvido como merece, previne riscos que, tais como estão as coisas, são previsíveis.
Um desses riscos é a balcanização do hospital, que já existe, mas que será incentivada com a criação dos CRIs, se esta se não processar como deve.
O mesmo se poderia dizer, mutatis mutandis, relativamente ao impacto esperável no crescimento da despesa directa com o funcionamento em CRIs não contrabalançada pelos resultados exigíveis. Diferentemente do que parece recear o Hospitaisepe, os CRIs também nos HH-EPE e nos das Parcerias podem existir e serem vistos como forma de reduzir e não de produzir maior despesa. Também com eles podem ser atingidos os resultados referidos por Cyril Chantler link que refere a redução de 15% nos custos totais, ao longo de 3 anos, mantendo a qualidade e a quantidade dos cuidados prestados; só que no Guy’s Hospital foram descentralizados os orçamentos e assumidos quatro princípios fundamentais: envolvimento dos clínicos, descentralização com accountability, desenvolvimento do trabalho de equipa entre os profissionais e a introdução de sistemas de informação.

9:56 da tarde  
Blogger xavier said...

Sobre este tema, recebi do dr. Vitor Raposo o seguinte mail:

Tratei o tema dos CRI na minha tese de doutoramento sobre a governação hospitalar, nomeadamente no ponto relativo às determinantes da governação hospitalar onde se incluíam decisões políticas passadas. Os CRI foram tratados recorrendo à pergunta "Na sua opinião o que é que explica o facto dos CRI, segundo dados de várias fontes, não terem sido assumidos ou implantados na maioria dos hospitais?”.

Para o efeito foram realizadas entrevistas a um painel de peritos. O painel de peritos era constituído por 22 personalidades com competência, técnica e profissional, conhecimento em termos de administração hospitalar e experiência de gestão em hospitais públicos e privados. Deste painel dezoito são membros dos CA (painel interno) de 8 hospitais seleccionados (dois hospitais SPA, um de grande dimensão e um pequeno; um hospital EPE que passou directamente de SPA para EPE; quatro hospitais EPE que anteriormente foram SA; um hospital EPE que foi anteriormente um SA e, antes disso, uma experiência inovadora de gestão) e quatro são peritos externos (painel externo). Foram entrevistados seis Presidentes do CA (PCA), sete Vogais executivos (VE), dois directores clínicos e três enfermeiros directores.

Resultados sobre os CRI, ver o PDF seguinte link


Victor Raposo

10:38 da tarde  
Blogger tambemquero said...

Genéricos gratuitos já custaram 35 milhões de euros aos cofres do Estado

Medida em vigor desde Junho tem impacto financeiro muito acima do previsto.

A comparticipação a 100% dos medicamentos genéricos a pensionistas mais pobres já custou ao Estado 35 milhões de euros. A medida entrou em vigor em Junho passado, mas em apenas seis meses o Governo já gastou o que estava previsto para um ano inteiro. Isto porque o estudo financeiro que serviu de base à medida previa que os encargos para o Serviço Nacional de Saúde fossem de 38,7 milhões de euros anuais.
Ao Diário Económico, o secretário de Estado da Saúde admite que a medida “teve impacto orçamental”. Contudo, Óscar Gaspar frisa que teve igualmente “um alcance social importante” e garante que não vai ser alterada: O Estado continuará a comparticipar a totalidade da despesa com medicamentos genéricos aos pensionistas com rendimentos inferiores ao salário mínimo nacional.
Aumentar a quota dos genéricos é uma das medidas que o Ministério da Saúde prevê para este ano. De acordo com as Grandes Opções do Plano 2010-2013, o Governo prepara-se para uma revisão global do actual sistema de comparticipação do medicamento, um pacote de medidas que será conhecido em Fevereiro. Para já, Óscar Gaspar avançou que as linhas gerais prendem-se com a promoção do mercado de genéricos, com a contenção da despesa hospitalar com medicamentos e com a correcção de algumas distorções de mercado, nomeadamente o preço de referência dos medicamentos de marca. ■ C.D.

Aumentar a quota dos medicamentos genéricos é uma das medidas previstas pelo Ministério da Saúde para 2010.


DE 22.01.10

Gostava de saber quantos cidadãos, à boa maneira portuguesa, não andam a beneficiar desta medida destinada aos pensionistas mais pobres.

9:39 da manhã  
Blogger DrFeelGood said...

Falhado o arranque do CRI do Santa Marta no dia 1 de Janeiro, José Fragata assume «desilusão»

«Tenho todo o direito a exigir» a agilização do processo»

José Fragata, que dirige a Cirurgia Cardiotorácica no Hospital de Santa Marta, reconhece que a passagem a CRI tem a sua «dificuldade». Mas também acha que falta «trabalho de casa», que compete à administração «agilizar» o processo e que é um direito seu exigi-lo.
Cerca de um ano depois de a ideia ter começado a germinar e dois meses após a homologação pela tutela, o Centro de Responsabilidade Integrada (CRI) de Cirurgia Cardiotorácica (CCT) do Hospital de Santa Marta (HSM) continua por passar do papel à prática. «Com bastante desilusão minha, não comecei no dia 1 de Janeiro», confessa José Fragata, que dirige o actual serviço e será o primeiro director do CRI.
O cirurgião tinha manifestado o desejo, em Novembro último, quando o serviço de CCT do HSM assinalava 50 anos, de arrancar com o novo modelo logo no primeiro dia de 2010. Confrontado pelo «TM», no passado dia 15, com o «queimar» da data, o médico avançou a seguinte explicação: «Sou um optimista por natureza, mas também realista, e quero pensar que isso se deve à dificuldade do processo.»
Para «montar» o CRI, o segundo a surgir na rede hospitalar pública e separado 10 anos do início da experiência de Coimbra, é preciso «muito trabalho de gestão» e «trabalho de casa feito», notou José Fragata. «Está na cabeça e em documentos, mas não está feito no terreno», ressalvou.
Questionado sobre se o seu «trabalho de casa» estava elaborado, o cirurgião respondeu afirmativamente. «Um modelo destes necessita de uma componente muito grande de administração — não só de administração clínica, mas de processo administrativo e de gestão — e, portanto, acredito que quem tem agora de agilizar isto é o conselho de administração [CA]», referiu.
O director do CRI mostrou-se sensível à dificuldade da tarefa, o que se traduzirá na demora, mas, ao mesmo tempo, disse esperar que a medida seja encarada «como necessária» pelo CA. «Não se deram ainda muitos passos concretos. Penso que por uma questão de oportunidade», acrescentou.
A ministra da Saúde homologou o CRI de CCT do HSM a 16 de Novembro. Uma decisão que produziu efeitos logo no dia a seguir. Daí que José Fragata já fale em «ex-serviço» e «actual centro», embora «ainda não praticante». A entrada em funcionamento do novo modelo de gestão é, como enfatizou, «absolutamente vital» para a CCT do hospital. E não só.
«Penso ser da maior importância para o Centro Hospitalar Lisboa Central (CHLC). Até porque há um frenesim na cidade para criação de CRI», referiu. Além disso, lembrou, o Governo tem olhado para os CRI e para a reforma hospitalar «como objectivos programáticos desta legislatura».

../ cont.

TM 25.01.10

5:56 da tarde  
Blogger DrFeelGood said...

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Convicção forte

Por tudo isto, a convicção de José Fragata é forte: «Não tenho dúvidas de que tenho todo o direito de passar não só a esperar como a exigir. Porque penso que se trata de um mandato nacional.»
A somar a isto, o cirurgião cardiotorácico entende estar mandatado pelo CA para preparar uma «unidade ágil», tendo em vista o futuro Hospital de Todos-os-Santos. «O meu mandato é ter, quando lá chegarmos, uma equipa jovem e activa. O CRI é instrumental para esse objectivo. É através dele que vou conseguir renovar o staff e atrair os melhores», explicou.
Segundo números divulgados anteriormente, a Cirurgia Cardiotorácica do Santa Marta tem feito intervenções anuais em cerca de 1300 doentes. O que representa um custo acima dos 16 milhões de euros. No ano passado, revelou o director do serviço ao «TM», o custo médio por doente cifrou-se nos 14 300 euros. Ora, tendo sido feitas cerca de 1200 intervenções cirúrgicas, o total cifra-se à volta dos 17 milhões de euros.
O desafio que José Fragata tem pela frente, com o CRI no horizonte, pode ser encarado de duas maneiras: «Baixar o custo por doente ou ter o mesmo dinheiro e fazer mais cirurgias. Eu queria fazer as duas coisas.»
O director desconhece ainda que financiamento terá. Uma das condições que colocou, contudo, e que foi aceite pelo CA, é a de que o pagamento será feito em função da complexidade dos tratamentos.
Caberá ao CRI, que gozará de autonomia, fazer com que se obtenha «receita positiva», assume o cirurgião, sublinhando que tal interessa a todos: aos colaboradores — «recebem incentivos porque trabalharam melhor»; ao CRI — «porque tem um fundo estrutural»; ao CHLC — «ganha com o seu CRI»; e à tutela — «pela reputação e administração judiciosa dos impostos dos portugueses».
Reconhecendo que a satisfação dos utentes deve ser a primeira preocupação, o médico disse ter uma outra, que considera inédita na função pública: «Zelar pelo grau de satisfação dos colaboradores e fazer com que se sintam “accionistas” do centro. Cada um deles deve sentir que do seu exercício resultam vantagens para si em dinheiro, oportunidades profissionais, bem-estar e bom trato.»
Como será a coabitação com os serviços em que as remunerações não dependem, por exemplo, da produtividade? «Se o regime remuneratório for muito diferente, vai haver naturalmente a sensação de rejeição por parte dos outros», antevê José Fragata, que, falando em transparência, aponta um caminho: «É adoptarem o modelo.»

Sérgio Gouveia

TM 25.01.10

5:57 da tarde  
Blogger DrFeelGood said...

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Superar Coimbra

As comparações com o CRI de CCT dos Hospitais da Universidade de Coimbra são inevitáveis, pois foi (é) o primeiro centro. Ainda por cima na mesma especialidade do criado em Santa Marta. Nada que José Fragata tema. «Queremos fazer pelo menos tão bem como Coimbra e tenho uma “pica” muito grande em tentar fazer melhor. Ficar-me-ia mal não ter essa ambição», assume.
No início do processo, o responsável do CRI dos HUC facultou, através da sua administradora, «muitos dados» ao centro que se desenhava em Lisboa, revela José Fragata, sublinhando a «excelente relação» entre os dois directores.
«Ele próprio me avisou de problemas do centro dele, que são normais. O professor Manuel Antunes tem um edifício de 11 anos exercido com competência e uma dedicação muito grande. A primeira coisa que se faz é ver o que os outros já fizeram», defende o director do CRI do HSM.

Mais 300 cirurgias

O orçamento com que o centro irá funcionar encontra-se ainda por acertar. No entanto, José Fragata já comprometeu-se com o número de cirurgias a efectuar no CRI de CCT do HSM: 1500. Cerca de mais 300 comparativamente a 2009. O crescimento só não será maior, esclareceu, devido à carência de pessoal não cirúrgico, principalmente enfermeiros e anestesistas.
O serviço tem três blocos operatórios que custam 600 euros por hora, quer sejam usados quer não, conforme já tinha sido tornado público pelo cirurgião cardiotorácico. Ao nosso Jornal, o médico revelou que teve de fechar um deles devido às referidas dificuldades com o pessoal.
«Por falta de pessoas, e como medida de gestão, fechei uma sala de operações, que uso como turnover. De qualquer maneira, vencem custos indirectos. É sempre um mau negócio, mas com uma contrapartida: na outra sala passámos a ter três doentes», explicou.
A decisão teve, entretanto, outra consequência. «Esse acto de gestão, que acho que foi bom em termos de pessoal e de recursos, teve algum impacte nos números e ficámos poucas dezenas de casos abaixo daquilo que eu tinha contratualizado com a administração», fez saber, salientando sempre a «falta de staff não cirúrgico».
Quando os tempos forem de CRI, o argumento não poderá ser invocado nos mesmos moldes. «A grande diferença com o centro é que me comprometo perante a administração do hospital, e indirectamente com a administração regional de Saúde, em realizar 1500 casos cirúrgicos num ano. O problema de como eu arranjo os recursos para isso é meu», distinguiu José Fragata, puxando também para si «o valor do exercício final».
Seguindo a mesma lógica, o conselho de administração também terá uma palavra a dizer caso o desfecho não seja o esperado. «Se o exercício correr mal, tem de me demitir, que é o normal com qualquer gestor medíocre», assume o director, aproveitando para deixar no ar um recado: «Não percebo, por isso, porque é que as pessoas têm receios. Culturalmente temos todos de evoluir muito. Não se devia temer à volta dos CRI, antes pelo contrário.»

TM 25.01.10

6:01 da tarde  
Blogger DrFeelGood said...

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«Entrega plena» garantida

Ao anunciar a homologação do CRI do HSM, durante as comemorações dos 50 anos do Serviço de Cirurgia Cardiotorácica, a ministra da Saúde pediu «dedicação plena» aos profissionais. Questionado sobre as palavras de Ana Jorge, designadamente se as entendia como sinónimo de exclusividade, José Fragata, garantindo «entrega plena», colocou a questão de outro ângulo.
«Tenho colaboradores que fazem urgências em hospitais periféricos para ganharem um pouco mais a vida. Se este centro criar condições remuneratórias suficientes pode não haver a necessidade de as pessoas trabalharem noutro sítio», referiu.
No seu caso pessoal, também opera uma ou duas vezes por semana num hospital privado — «o que me poderá gastar poucas horas». Todavia, a sua actividade resume-se à cirurgia cardíaca. Isto para dizer que não tem outros cargos, por exemplo, em administrações, sociedades científicas ou representações internacionais. «É impensável tomar a responsabilidade de uma coisa destas sem abertura de espírito para a dedicação plena», concluiu, tendo o CRI em mente.
E reforçou a ideia com a sua «disponibilidade permanente», como aconteceu no dia em que recebeu o «TM»: fez um transplante de madrugada (até às seis horas) e pouco depois estava de volta ao hospital.

TM 25.01.10

6:01 da tarde  
Blogger DrFeelGood said...

Oftalmologia dos HUC organiza-se como CRI

Joaquim Murta tomou posse como director de serviço e será responsável pelo centro

Os Hospitais da Universidade de Coimbra (HUC) terão em breve o seu segundo centro de responsabilidade integrada (CRI), desta vez na área de Oftalmologia. Joaquim Murta será o responsável.
O conselho de administração (CA) dos Hospitais da Universidade de Coimbra está a analisar a proposta feita pelo Serviço de Oftalmologia para se organizar como CRI. Depois do Centro de Cirurgia Cardiotorácica, dirigido por Manuel Antunes, que adoptou este modelo de gestão há mais de 10 anos — e que é, ainda hoje, o único do País—, os HUC deverão ter brevemente um segundo CRI. O oftalmologista Joaquim Murta será o responsável pela estrutura de gestão que se caracteriza, entre outros aspectos, por uma maior autonomia e responsabilização, regras de financiamento e de remunerações dependentes da actividade realizada e dos resultados obtidos.
De acordo com o presidente do CA dos HUC, Fernando Regateiro, «a proposta está a ser analisada e o regulamento interno do centro a ser discutido», num processo que deverá estar concluído até final de Fevereiro. O regulamento interno dos HUC prevê já a criação destes centros e de outras estruturas de gestão intermédia — áreas de gestão integrada (AGI), que agrupam vários serviços, ou unidades de gestão operacional (UGO), formadas pelos serviços de menor dimensão —, pelo que a criação do CRI não tem de ser submetida à tutela. «Temos autonomia para o fazer, lançámos esse desafio aos directores de serviço e, além deste, temos já outro serviço interessado em avançar», referiu Fernando Regateiro, esperando que mais estruturas do hospital reflictam sobre estas formas de organização.
Os CRI, segundo o regulamento interno dos HUC, «são estruturas de gestão não integradas em AGI, de dimensão adequada, dotadas de objectivos específicos e de um conjunto de meios materiais e humanos». O seu director é nomeado pelo CA e tem um mandato de três anos, cabendo-lhe, entre outras competências, a de elaborar a proposta de contrato-programa (plano de acção e orçamento) para submeter à aprovação do CA; o cumprimento desse mesmo contrato-programa; a elaboração do relatório de execução e ainda outras competências que o CA lhe delegar. «O CRI terá um sistema de incentivos, previsto no seu regulamento, sujeito a contratualização anual com o conselho de administração», acrescenta o documento.
Recorde-se que, no mês passado, em audição na Comissão Parlamentar de Saúde, a ministra da tutela, Ana Jorge, revelou a intenção de implementar, de forma gradual, em hospitais e serviços, um modelo de organização tipo CRI.
No que se refere a outras estruturas de gestão intermédia, os HUC criaram já cinco AGI que agrupam vários serviços com afinidade e complementaridade, e muito em breve haverá outras duas AGI que abrangem todos os serviços cirúrgicos.

Alice Oliveira

TM 25.01.10

6:26 da tarde  
Blogger e-pá! said...

Caro Brites:

Quem conviveu de perto com um CRI (CCT-HUC) subscreve, sem reservas, a conclusão do seu post.

"E os contratos, meus Caros Amigos, os contratos são para cumprir" (pelos CA e pelos CRI's)...

Na verdade, os incumprimentos são múltiplos. Grande parte das vezes por parte do CA.

Mas tenho que dar a mão à palmatória e reconhecer que uma experiência isolada, não é significativa.

7:39 da tarde  
Blogger joana said...

Remodelação Cascais passou a privado e o Amadora-Sintra a público. Um ano depois, os utentes não notam diferenças apesar das melhorias

A ordem foi dada pelo próprio primeiro-ministro para ter o peso de uma ‘medida de força’: a gestão privada tinha de sair do Hospital Amadora-Sintra e entrar no Hospital de Cascais. O sinal de reforma ficou claro, mas um ano depois está a ‘meio gás’. Os utentes dizem que não deram pela mudança, os médicos trabalham o mesmo, mas agora com medo de perder benefícios, e os gestores acenam com resultados ligeiramente melhores. Há ainda outro facto em comum: os administradores públicos que substituíram o Grupo Mello no Amadora-Sintra e os Hospitais Privados de Portugal que tomaram o lugar do Estado em Cascais seguem, afinal, a mesma regra — cumprem números predefinidos, no caso, pelo Estado. O balanço não surpreende os especialistas. “Não será ao fim de um ano que se conseguem ver mudanças. Só são perceptíveis para alguém experiente e com ‘uma lupa’”, ironiza o economista de Saúde, Jorge Simões. Mas para o presidente da Associação Portuguesa de Administradores Hospitalares, Pedro Lopes, “se os utentes falam numa certa estabilidade, significa que não houve ruptura”.
Seja qual for o argumento, é um facto que a maioria dos utentes não deu pela remodelação. Contudo, há mudanças (ver caixa). O Amadora-Sintra tem mais médicos e enfermeiros e já começou a preparar as obras na congestionada Urgência e em Cascais, por exemplo, opera-se até mais tarde. O bloco operatório passou a funcionar com horário alargado. Ao que parece, os resultados não se vêem porque acabam por ficar escondidos atrás da procura sobrecarregada no Amadora-Sintra e do espaço exíguo do Hospital de Cascais.
“Não tinha ideia da mudança. Continuamos muito tempo à espera, mas quando chegamos ao médico é rápido”, desabafa Ariana, 17 anos, ao fim de três horas na Urgência de Cascais. O desconhecimento repete-se no Amadora-Sintra. “Não sabia que os Mello já não estavam cá. Não notei diferença e não tenho razão de queixa”, diz Jaime Oliveira, 50 anos. Entre os utentes mais atentos, a avaliação é semelhante. “Já tinha ouvido falar dos privados. Estive aqui internado há cinco anos e não mudou nada”, garante José Oliveira, 43 anos, há cinco dias numa maca na Urgência de Cascais. António Martins, 67 anos, deixa um apelo: “Precisamos do novo hospital”. O desejo deverá concretizar-se a partir do dia 23 de Fevereiro.
Ao Expresso, os administradores dos dois hospitais garantiram que não haverá despedimentos, mas nem por isso os profissionais estão tranquilos. Em Cascais temem a mudança do vínculo laboral e no Amadora-Sintra a perda de regalias. Ainda assim, os clínicos desta unidade dão um voto de confiança: “Esta administração não alterou o funcionamento e manteve as pessoas”, reconhece o delegado do Sindicato Independente dos Médicos Carlos Martins. Em Cascais, aconteceu o contrário: mudaram as chefias. “Falharam na liderança e na organização”, justifica o director clínico, João Varandas

Expresso 23.01.10

Estes processos de mudança complexo têm sido conduzidos de forma cirúrgica por equipas competentes.
As melhorias são visíveis e incontestáveis.
Embora a mudança do novo hospital de Cascais seja incomparavelmente muito mais complexa e delicada.
Um verdadeiro "case study" a abrir novas perspectivas para a gestão do SNS.

3:44 da tarde  

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